Ícones da Virgem da Sarça Ardente no Sinai
A Mãe de Deus é omnipresente no Sinai desde que Moisés teve a visão da Virgem sob a forma da Sarça Ardente no sopé do Monte Sinai
A Mãe de Deus é omnipresente no Sinai desde que Moisés teve a visão da Virgem sob a forma da Sarça Ardente no sopé do Monte Sinai. Ouviu a voz de Deus que lhe pedia para tirar as sandálias, "porque o lugar onde estás é terra santa" (Êxodo 3,1-5).
Posteriormente, Deus apareceu a Moisés no Sinai e entregou-lhe as Tábuas da Lei. A transformação do Monte Sinai num dos últimos loca sancta do Antigo Testamento criou as condições adequadas para que os eremitas aí vivessem desde, pelo menos, o século IV até meados do século VI, altura em que o imperador Justiniano lhes pediu que estabelecessem um mosteiro fortificado no sopé do Monte Sinai, no local onde ainda se encontrava a Sarça Ardente. Consequentemente, o mosteiro foi dedicado à Virgem da Sarça.
Embora a dedicação do mosteiro tenha mudado, muito provavelmente no início do século XIII, da Virgem da Sarça Ardente para Santa Catarina, depois de se ter tornado depositário do corpo de Santa Catarina, isso não diminuiu o estatuto da Mãe de Deus no Sinai. Pelo contrário, se olharmos para os ícones que sobreviveram no mosteiro, o número dos que representam a Virgem é o mais elevado, não só quando comparado com os de Santa Catarina, mas também com os do próprio Cristo, embora a basílica do mosteiro tenha sido dedicada à Transfiguração de Cristo.
De entre as muitas representações da Mãe de Deus nos ícones portáteis do Sinai, deve ser dado especial destaque aos ícones da Virgem da Sarça, por ser esta a sua representação mais sinaítica. É o ícone locus sanctus da Mãe de Deus no Sinai. No entanto, é estranho que a imagem da Mãe de Deus sob a forma da Sarça Ardente apareça pela primeira vez nos ícones do Sinai bastante tarde. A mais antiga representação sobrevivente da Virgem no Sinai, na qual está inscrita como Μήτηρ Θεοῦ ἡ τῆς Βάτου ("Mãe de Deus da Sarça"), mostra a Virgem no tipo iconográfico da Kyriotissa. Este ícone é assinado pelo pintor Petros, cuja presença no mosteiro está documentada na década de 1220. A obra de Petros está talvez significativamente associada à visita do Patriarca de Jerusalém, Euthymios II, ao Sinai. Este último morreu no Sinai e foi sepultado no mosteiro. A sua lápide de mármore, ainda de pé no canto nordeste da basílica do mosteiro, ostenta uma inscrição em árabe e grego com a data da sua morte, 13 de dezembro de 1223. Um ícone do pintor Petros mostra Moisés com as Tábuas da Lei e Euthymios II, em súplica, de um lado e do outro da Virgem Blachernitissa, sob a forma de uma Mãe de Deus de pé, orans, com o Menino Jesus num medalhão diante do peito. Este ícone deve ter sido pintado por volta da época da morte de Euthymios II, pois ele é referido nele como μακάριος ("abençoado"). Parece provável que este ícone tenha sido pendurado junto ao seu túmulo. A mais antiga representação sobrevivente da Virgem como a Sarça Ardente, juntamente com Moisés tirando as sandálias, encontra-se hoje não no Sinai, mas em Jerusalém. Trata-se de um ícone de finais do século XII, no Patriarcado Ortodoxo Grego de Jerusalém. A Virgem está sentada no centro da sarça flamejante, enquanto um anjo se aproxima dela por cima. Um medalhão com o Menino Jesus diante do seu peito aproxima esta representação do tipo iconográfico Blachernitissa. Na mão direita, segura um fuso, como se se tratasse de uma cena de Anunciação. É de notar que, já no século IV, vários Padres da Igreja tinham interpretado o milagre da Sarça Ardente como uma parábola do Antigo Testamento sobre a Virgem Maria como recetáculo do nascimento de Cristo.
É razoável perguntar por que razão uma imagem tão importante como a Virgem da Sarça, que se tornou o ícone locus sanctus da Mãe de Deus no Sinai, não adquiriu um tipo iconográfico próprio, mas baseou-se no da Virgem Kyriotissa e, ocasionalmente, no da Virgem Blachernitissa, ambos de inegável origem constantinopolitana.
Num ícone do Sinai com Santa Catarina e a Virgem Kyriotissa, a sarça flamejante estende-se do chão e cobre o corpo da Virgem (Sala 2, 7.5). Neste ícone, Moisés, em escala diminuta, é representado entre Santa Catarina e a Virgem, e está de pé diante da Sarça, tirando as sandálias. Um segundo Moisés, também em escala diminuta, está à direita da Virgem, levantando a mão direita. Este ícone, geralmente datado do século XIII, apresenta, na minha opinião, muitas das características do estilo de Petros. Se esta ligação for aceite, o ícone foi muito provavelmente pintado na década de 1220.
Num outro ícone do Sinai, o díptico com São Procópio na ala esquerda e a Virgem Kykkotissa na ala direita, a Virgem da Sarça Ardente, pintada na moldura superior da ala direita, adoptou uma iconografia diferente: uma Virgem orante, de busto, totalmente imersa na sarça flamejante. Este facto aproxima a representação da Virgem da Sarça do tipo iconográfico Blachernitissa, o que a liga ao ícone que se encontra hoje no Patriarcado Ortodoxo Grego de Jerusalém, já referido anteriormente.
Embora este pequeno ensaio se centre nos ícones, é relevante ter em conta a representação a fresco da Virgem da Sarça Ardente na abside da capela dedicada a São Tiago, situada no canto nordeste da basílica do Sinai (Fotografia 46). A Virgem da Sarça ardente é representada no centro da composição, entre São Tiago e São João Crisóstomo, à esquerda, e São Basílio e Moisés, à direita. A sua representação segue a fórmula iconográfica de uma Virgem orante com as mãos abertas, enquanto as chamas da sarça envolvem a sua figura. A data do século XV deste fresco, proposta por Manolis Chatzidakis, foi posta em causa por Vojislav Djuri e, mais recentemente, por Georgi Parpulov, que sugeriu uma data do século XIII. Esta data do século XIII parece ser a mais convincente para este fresco, o que também justifica a sua atribuição a Petros.
O que ressalta desta breve pesquisa é a importância do estatuto especial do mosteiro do Sinai no desenvolvimento do imaginário da Virgem da Sarça Ardente. Trata-se de um caso importante de uma nova iconografia desenvolvida na região, e não em Constantinopla. Poderá também ter sido estimulada por circunstâncias locais como a descoberta das relíquias de Santa Catarina, mas ao mesmo tempo a insistência em continuar o significado ainda maior dos lugares onde se acreditava que Deus tinha aparecido a Moisés e, no caso da Sarça, que tinha predito o nascimento de Cristo no ventre de uma virgem. MV